Você já ouviu falar sobre o IBS e como ele pode impactar os planos de saúde? Neste artigo, vamos explorar as mudanças na base de cálculo e suas implicações para os beneficiários e operadoras.
IBS e Planos de Saúde: Entenda o Alargamento da Base de Cálculo
A Lei Complementar nº 214/2025 trouxe novidades importantes para o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), especialmente no que diz respeito aos planos de assistência à saúde. Essa regulamentação, prevista nos artigos 156-A, § 6º, inciso II, e 195, § 16, da Constituição, estabeleceu um regime específico para o setor. Mas será que a forma como a base de cálculo foi definida está alinhada com a proposta inicial?
A Materialidade do IBS nos Planos de Saúde pela LC nº 214/2025
Quando o legislador complementar tratou do IBS para os planos de saúde, ele foi bem específico. O artigo 234 da Lei Complementar nº 214/2025 definiu que a materialidade do imposto incidiria exclusivamente sobre a “prestação de serviços de plano de assistência à saúde”. Isso significa que o foco da tributação deveria ser o serviço em si, ou seja, a garantia de cobertura assistencial que as operadoras oferecem, seja por meio de rede própria, credenciados ou reembolso.
Um plano de saúde, como sabemos, é um contrato contínuo que assegura essa cobertura, mediante um pagamento. A essência do serviço é garantir o acesso à saúde. Portanto, a ideia era que o IBS incidisse sobre essa atividade principal, e não sobre outras operações que não estivessem diretamente ligadas à prestação do serviço de assistência.
Base de Cálculo e a Capacidade Contributiva: Uma Relação Essencial
Mesmo que a base de cálculo e a materialidade de um tributo sejam conceitos distintos, eles precisam andar de mãos dadas. A Constituição, em seu artigo 145, § 1º, estabelece que os impostos devem ser orientados pela capacidade contributiva. Em outras palavras, o imposto deve incidir sobre uma manifestação de riqueza que realmente reflita a capacidade econômica do contribuinte em relação àquela atividade específica.
Se a base de cálculo de um imposto se afasta muito da sua materialidade, o legislador pode acabar tributando riquezas que não têm relação com o fato gerador original. Isso pode violar o princípio da legalidade e até mesmo desrespeitar a distribuição de competências tributárias entre os entes federativos. Grandes nomes do Direito Tributário, como Paulo de Barros Carvalho e Luís Eduardo Schoueri, reforçam que a base de cálculo deve ser a medida econômica da materialidade eleita, sem extrapolar seus contornos.
O Alargamento da Base de Cálculo na LC nº 214/2025
A grande questão surge com o artigo 235 da LC nº 214/2025. Antes da Emenda Constitucional nº 132/23, a jurisprudência já indicava que a base de cálculo nos planos de saúde deveria considerar apenas a remuneração líquida das operadoras, ou seja, o que sobrava das mensalidades após as despesas assistenciais. Esse modelo mantinha a coerência com a materialidade do serviço.
No entanto, a nova lei complementar incluiu na base de cálculo do IBS as receitas financeiras. Estamos falando de rendimentos de ativos garantidores e reservas técnicas, que são exigências regulatórias para as operadoras. Essa inclusão rompe com a lógica anterior, pois passa a tributar ganhos financeiros que não vêm diretamente da prestação de serviços de saúde, mas sim de aplicações financeiras.
Receitas Financeiras: Uma Materialidade Distinta
As receitas financeiras, conforme o conceito da Lei nº 9.718/98, são manifestações econômicas diferentes. Elas estão ligadas a rendimentos de aplicações ou juros. No contexto das operadoras de planos de saúde, esses recursos são uma consequência da necessidade de manter reservas, e não representam um serviço prestado aos beneficiários. Incluir essas receitas na base de cálculo do IBS para planos de saúde significa, na prática, tributar uma materialidade que não foi a escolhida inicialmente pela própria lei complementar.
Isso gera um deslocamento da tributação, aproximando-a de um imposto sobre a renda ou patrimônio, e não sobre serviços. Além disso, essas operações financeiras já podem ser tributadas em outros contextos, como no âmbito da prestação do serviço financeiro pela instituição bancária.
Implicações Constitucionais do Alargamento
Diante desse cenário, surge uma aparente contrariedade aos princípios constitucionais. Ao eleger os serviços de planos de saúde como materialidade do IBS, o legislador se autolimitou. Quando ele inclui na base de cálculo receitas que expressam uma manifestação econômica de fatos distintos, ele pode estar desrespeitando a capacidade contributiva e o princípio da legalidade, previstos no § 1º do artigo 145 e no inciso I do artigo 150 da Constituição Federal.
Em resumo, mesmo sem instituir o IBS sobre operações financeiras, a lei faz com que o imposto incida sobre essas manifestações econômicas por meio de um alargamento da base de cálculo que parece indevido. Isso levanta sérios questionamentos sobre a coerência e a constitucionalidade da medida.
Fonte: Conjur

